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Adoção Homoparental

  • Foto do escritor: Ligia Bertaggia de Almeida Costa
    Ligia Bertaggia de Almeida Costa
  • 20 de out. de 2020
  • 5 min de leitura


A adoção de crianças e adolescentes é regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e não existe qualquer impedimento com relação às pessoas homossexuais ou casal formado por pessoas do mesmo sexo.

Como o Dr. Rodrigo da Cunha Pereira menciona em seu dicionário jurídico: nunca houve proibição legal expressa para tais adoções no ordenamento jurídico brasileiro, apenas interpretações contrárias ou favoráveis, de acordo com a concepção e moral particular dos envolvidos em tais processos. (PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Dicionário de direito de família e sucessões: ilustrado. São Paulo: Saraiva, 2015. P. 60)

Portanto, para a adoção bastam a vontade, a disposição e o pleno atendimento dos artigos 42 e 43 do ECA, sendo que ela só será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos, o que traduz, visceralmente, no atendimento do Princípio do Melhor Interesse da Criança.

Antigamente, a adoção por casal homoafetivo (ou homoparental, como prefiro me referir) não era muito bem aceita e, por essa razão, como diz a Dra. Maria Berenice Dias em sua doutrina de Direito de Família: num primeiro momento, homens gays e lésbicas se candidatavam individualmente à adoção, não sendo questionado se mantinham relacionamento homoafetivo. Assim, não era feito o estudo social com o parceiro, o que tornava a habilitação deficiente e incompleta, deixando de atentar aos prevalentes interesses do adotando. (DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 11. Ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. P. 497)

Ainda, a autora completa dizendo que, o resultado também vinha em prejuízo à criança, que vivendo em família homoafetiva e possuindo vínculo jurídico com somente um do casal, restava absolutamente desamparada com relação ao outro, que também considerava pai ou mãe, mas que não tinham os deveres decorrentes do poder familiar. O não estabelecimento de uma vinculação obrigacional gerava absoluta irresponsabilidade de um dos pais para com o filho que também era seu na prática.

Ou seja, a ampliação do conceito de família e o respeito às famílias contemporâneas, sejam elas monoparentais ou homoafetivas, trouxeram mais possibilidades e segurança às crianças e aos adolescentes que precisam de um lar acolhedor e de pessoas amorosas nos seus cuidados.

Vale dizer que o reconhecimento judicial das famílias homoafetivas, feito pelo Supremo Tribunal Federal em 2011, transpôs a resistência e facilitou a adoção de crianças e adolescentes por casais homoafetivos, afinal de contas, eles foram reconhecidos como família, superando o conceito clássico unicamente heterossexual.

Como bem pontua a advogada Marianna Chaves, a exigência de fundamentos legítimos e ambiente familiar propício não significa que somente um casal formado entre homem e mulher unidos por matrimônio esteja autorizado a adotar crianças e jovens conjuntamente, como há bastante tempo já vem deixando claro a jurisprudência brasileira nos tribunais estaduais e no Superior Tribunal de Justiça. A decisão do TJRS (AC n.º 70013801592, 7.ª C Civ, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, j. 05/04/2006) já afirmou que diversas investigações nessa matéria não apontam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga aos seus cuidadores. (CHAVES, Marianna. Adoção por casais do mesmo sexo no Brasil e em Portugal in Famílias, Psicologia e Direito / Tereza Rodrigues Vieira; Valéria Silva Galdino Cardin; Bárbara Cossettin Costa Beber Brunini (organizadoras) – 2. Ed. – Brasília/DF: Zakarewwicz Editora, 2018. P. 319)

Assim, seja qual for o casal (lembrando que a adoção também pode ser deferida a uma pessoa solteira, divorciada ou viúva), necessária e essencial, portanto, a correta habilitação, a demonstração do casamento ou da união estável, da estabilidade, uma boa estrutura do núcleo familiar e de uma rede de apoio, ou seja, a comprovação de que a família adotante apresenta reais vantagens ao adotado, para que este não permaneça indefinidamente em uma instituição de acolhimento.

Isso significa dizer que a adoção por casais homoafetivos deve, assim como nos outros casos, beneficiar a criança, em primeiro lugar. Afinal de contas, é a criança que tem o direito de desenvolver no âmago de uma família, que precisa de um lar e de um núcleo de amor.

Como bem dizem os Drs. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, a adoção atribui ao adotado a condição de filho, para todos os efeitos de direito, pessoais e patrimoniais, inclusive sucessórios, em regime de absoluta isonomia em face dos filhos biológicos, desligando-o dos seus pais naturais, mantidas, tão somente, as restrições decorrentes dos impedimentos matrimoniais. (GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direto civil, volume 6 / Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho – 7. Ed. – são Paulo: Saraiva, 2017. P. 691)

Nesse passo, a Dra. Marianna diz que os mitos sobre supostas afrontas ao melhor interesse da criança estão sendo desconstruindo, posto que, considerando o avanço da sociedade, bem como as novas configurações da entidade familiar, mormente em atenção aos princípios constitucionais da igualdade, liberdade e dignidade da pessoa humana, não há que se falar em impedimento à adoção de crianças por casais do mesmo sexo, em observância, ainda, aos diversos estudos que concluem pela inexistência de sequelas psicológicas naquelas provenientes de famílias homoafetivas, bem como diante da ausência de óbice legal. (TJMG, AC 1.0480.08.119303-3/001 (1), Rel. Des. Armando Freire, j. 24/05/2011). (CHAVES, Marianna. Adoção por casais do mesmo sexo no Brasil e em Portugal in Famílias, Psicologia e Direito / Tereza Rodrigues Vieira; Valéria Silva Galdino Cardin; Bárbara Cossettin Costa Beber Brunini (organizadoras) – 2. Ed. – Brasília/DF: Zakarewwicz Editora, 2018. P. 322)

Ainda, informa que muitos estudos vêm avaliando o desenvolvimento e os resultados psicossociais de crianças cujos pais são gays ou lésbicas. Em regra, o resultado é sempre o mesmo: observam que os recursos sociais e econômicos da família e a força (qualidade) das relações entre os membros da entidade familiar são variáveis muito mais importantes para o desenvolvimento saudável e bem-estar das crianças do que a orientação sexual dos pais. (CHAVES, Marianna. Adoção por casais do mesmo sexo no Brasil e em Portugal in Famílias, Psicologia e Direito / Tereza Rodrigues Vieira; Valéria Silva Galdino Cardin; Bárbara Cossettin Costa Beber Brunini (organizadoras) – 2. Ed. – Brasília/DF: Zakarewwicz Editora, 2018. P. 322)

A orientação sexual não possui relação direta com a convivência familiar nem com a educação dada pelos pais.

Desse modo, temos que o bem-estar da criança deve se sobrepor a tudo, afinal de contas, se trata de um sujeito de direitos, sendo dever do Estado e de toda a sociedade assegurá-los e efetivá-los, priorizando o atendimento de suas necessidades e sua proteção física e jurídica.

O melhor interesse da criança e do adolescente é o princípio norteador da adoção, pois possibilitar o amor, o cuidado, o afeto, o pleno desenvolvimento físico e psíquico sadios, a proteção integral, um lar harmonioso e estável, ou seja, uma vida verdadeiramente digna, é o mínimo que deve ser feito por estes que foram dados para adoção ou deixados à própria sorte, sofrendo com o abandono.

A possibilidade de oferecer uma vida digna a uma criança ou a um adolescente não podia ser condicionada a orientação dos pais adotantes, de forma alguma.

Ainda bem que os novos contornos familiares e a valorização do afeto, bem como o respeito à união de pessoas do mesmo sexo, permitiram que a adoção passasse a ser vista sob uma nova perspectiva, a da criança.

Ver a adoção da perspectiva da mãe ou do pai que não tem condições de ter filhos é limitar a vida dos que mais precisam de amor e de uma família.

O direito à maternidade e à paternidade são inerentes à pessoa humana e não podem ser negados a ninguém. Além disso, o direito a uma família é algo sublime e deve ser garantido a todos.

Com isso, forçoso concluir que é do ângulo da criança e do adolescente que a adoção deve ser vista.

É o menor que precisa de uma família. Seja ela como for, mas que seja repleta de afeto e que sempre favoreça o adotado, por parte de ambos os pais quando o casal for exercer a paternidade de fato, não havendo mais razão para se esconderem atrás de uma pessoa só, para isso ser efetivado.

 
 
 

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